Integridade esportiva: clubes brasileiros buscam educar atletas para coibir casos de manipulação

Atualizado: 7 Mar 2024
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Heloísa Vasconcelos

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Foto: Unsplash

Em 2023, a operação Penalidade Máxima, conduzida pelo Ministério Público de Goiás, revelou que grupos criminosos oferecem dinheiro para jogadores de futebol manipularem partidas, com ações como receber cartões ou cometer pênaltis.

A preocupação com a manipulação de partidas no Brasil ficou ainda mais evidente com a divulgação, na última segunda-feira (4), de estudo feito pela empresa de monitoramento Sportradar.

A companhia, contratada pela CBF desde 2018, apontou o país como aquele que tem mais movimentações consideradas suspeitas. Mas, afinal, o que os clubes têm feito para coibir esse tipo de ações?

A resposta para essa pergunta esteve em debate sobre a integridade esportiva no SBC Summit Rio, nesta quinta-feira (7). Em entrevista ao Aposta Legal Brasil, dirigentes de clubes brasileiros manifestaram preocupação em conscientizar atletas e funcionários sobre possíveis aliciadores desde as categorias de base.

“Temos um manual de conduta interno, que é aplicado não só para os funcionários, como também para os atletas, e esse tema está intrínseco dentro desse manual, para trazer todas as boas práticas. Ainda é um tema que a gente está evoluindo”, destacou Arnaldo Garcia, diretor de marketing e negócios do Coritiba.

No Botafogo, a necessidade de responder a investidores estrangeiros da SAF, comandada pelo empresário americano John Textor, é um motivo de atenção especial no combate à manipulação de jogos.

“Ter a SAF nessa linha de frente, numa gestão mais moderna e mais avançada do que demais instituições, é um ponto muito positivo para a gente ter essa sinergia entre a área de negócios e o futebol. Isso possibilita que a gente tenha essa conversa, esse dia a dia mais próximo, e evite algum risco para a imagem do clube ou para o próprio atleta, que é o nosso maior patrimônio. Não podemos dar bobeira nessa situação”, explicou Rafael Ganem, diretor comercial da SAF do clube carioca.

“E isso é uma preocupação nossa muito grande, de acordo com as nossas marcas que temos hoje na nossa camisa, são marcas internacionais, marcas que têm um olhar muito forte ao compliance. Não podemos, de maneira nenhuma, falhar com esses parceiros porque trazemos eles para o projeto justamente pela confiança que eles têm em nós”, acrescentou.

O dirigente botafoguense ratificou que os contratos dos jogadores preveem punições em caso de participação em fraudes.

“Temos multas previstas em contrato, mas são cláusulas sigilosas. Temos sempre, de acordo com o empresário, de acordo com o atleta, com as partes, alguns limites para não termos nenhuma decepção”.

Clubes à frente da educação

Diante da missão de manter a integridade do esporte, os dirigentes defendem que os clubes devem estar à frente do papel de educadores.

“Acredito que tem que partir de nós também essa iniciativa de educar, principalmente que cada clube tem o seu consumidor e conhece o seu consumidor. Portanto, é um momento importante para a gente poder educar os nossos públicos”, ressaltou Arnaldo Garcia, do Coritiba.

A operação Penalidade Máxima, do MP-GO, identificou casos de fraudes em partidas de campeonatos estaduais e também das Séries A e B do Brasileirão. Já o relatório da Sportsradar, citado anteriormente, indicou que, dos 109 pegos no radar da empresa, 15 são de competições geridas pela própria CBF: um pela série B do Brasileiro, 13 pela série D e um pela Copa Verde.

Esses episódios deixam os gestores de grandes clubes do futebol brasileiro em alerta. “Temos feito um trabalho de prevenção, orientando nossos atletas da base ao profissional, desde a assinatura do contrato, com as regras muito claras e tudo mais, até palestras e apresentações que temos feito internamente e conversas com eles. Acreditamos muito nesse trabalho de prevenção, porque é o caminho para a gente evitar um risco maior, um dano maior no futuro”, salientou Rafael Ganem, do Botafogo.

Prevenção desde a base

O trabalho preventivo dos clubes não se restringe às equipes profissionais. Os atletas da base botafoguense são orientados sobre a importância da integridade do esporte desde a escola, em projeto acompanhado de perto pela direção da SAF alvinegra.

“Todos os nossos atletas da base têm a bolsa para estudar no colégio. Então, a gente acredita muito numa entrega completa. Eles têm a educação dos seus pais, têm o nosso apoio pedagógico e psicológico da nossa área de responsabilidade social, têm a escola e têm o nosso apoio na parte mais técnica e no detalhe do que fazer e do que não fazer, principalmente no mundo relacionado a bet, e claro, a comportamento”, observou Ganem.

Além de dirigentes, o debate sobre a integridade no esporte no SBC Summit Rio contou com a participação de representantes de entidades ligadas ao segmento. Filipe Alves Rodrigues, membro do Instituto Brasileiro de Direito Desportivo, ressaltou que a educação tende a ser mais eficiente do que ações punitivas.

“Quando estuda a integridade esportiva no mundo, você percebe que punição é 10% da questão da integridade esportiva. Educação e prevenção são mais importantes na integração do que a punição. Claro que punir é necessário, mas educação e prevenção são fundamentais para que a integridade esportiva exista”, comentou, ao reivindicar uma postura mais ativa da CBF.

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A maior entidade esportiva do futebol, que é a CBF, não tem um programa de integridade. Ela não tem um programa definido de manipulação de resultados. O que ela faz é um acompanhamento de partidas.
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Filipe Alvez

Membro do Instituto Brasileiro de Direito Desportivo

Combate global à manipulação de resultados

Presidente da União de Loterias pela Integridade nos Esportes (ULIS), Ludovico Calvi ressaltou que o processo de conscientização de atletas e combate a fraudes no futebol deve ser feito globalmente.

“Deve haver um código de conduta em todos os clubes do Brasil, da América Latina, do mundo inteiro. A ULIS trabalha com a FIFA, a UEFA, o Comitê Olímpico Internacional, a Interpol, Europol, FBI, com todas as polícias no mundo, porque é uma aliança entre polícia, reguladores e operadores de jogo. É um outro sistema e ninguém pode ganhar essa luta se não juntos”, observou.

“Muitas vezes, acontece que as apostas são feitas em um país, o dinheiro chega de um outro país, e o jogo é no terceiro país. As organizações criminosas fazem isso porque vão distribuir o risco”, complementou.

Para ele, no Brasil, os baixos salários recebidos pelos jogadores de divisões mais baixas são uma das raízes do problema da manipulação de resultados. Assim, é imprescindível trabalhar com conscientização.

“Fazemos cursos para atletas, que não entendem como é complexo o mundo das apostas esportivas. É por isso que tem que fazer, é preciso a formação, a informação, treinar as pessoas e informar o público”, avaliou.

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