Governo estuda autoteste psicológico obrigatório para apostadores
O governo federal estuda implementar um autoteste psicológico para apostadores como parte das novas medidas de prevenção e redução de danos no mercado legal de apostas esportivas e jogos on-line.
A proposta foi apresentada no Relatório Interministerial de Saúde Mental e Prevenção do Jogo Problemático, elaborado em parceria entre os ministérios da Fazenda, Saúde, Esporte e a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom).
O autoteste, desenvolvido pela Universidade de São Paulo (USP) sob coordenação do psiquiatra Hermano Tavares, permitirá que o jogador avalie seu comportamento e identifique sinais de risco de forma rápida e confidencial.
Segundo o relatório, as operadoras de apostas devem disponibilizar a ferramenta em suas plataformas, e a Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA) deverá definir, por norma específica, se o uso será obrigatório ou recomendado.
A iniciativa faz parte de um plano mais amplo que inclui a criação de uma plataforma nacional de autoexclusão — que permitirá ao usuário bloquear voluntariamente o acesso a todos os sites de apostas licenciados — e a capacitação de profissionais do SUS para acolher e orientar apostadores com comportamento compulsivo.
Retrato atual: ludopatia ainda é pouco registrada no SUS
Entre janeiro de 2018 e maio de 2025, o Sistema Único de Saúde (SUS) realizou 10.553 atendimentos por transtornos relacionados a jogos e apostas. O número ainda é pequeno diante do universo total de atendimentos em saúde mental.
Desse total, 4.316 atendimentos ocorreram nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e 6.237 na Atenção Primária à Saúde (APS).
Os registros consideram diagnósticos de jogo patológico (F63.0) e mania de jogo e aposta (Z726), categorias que começam a ganhar espaço nos sistemas públicos de saúde mental.
Para efeito de comparação, o SUS registra anualmente cerca de 450 mil atendimentos por depressão, 280 mil por transtorno bipolar e 800 mil por dependência de álcool ou drogas.
Ou seja, para cada atendimento por ludopatia, há centenas por outros transtornos mentais.
O dado mostrado no relatório mostra que a ludopatia ainda pode ser subnotificada e subdiagnosticada, não necessariamente ausente. No estudo publicado, o governo federal destaca a necessidade de criar protocolos padronizados para identificação e tratamento dos casos dentro do sistema público.
Para cada atendimento do SUS relacionado ao vício em apostas, há pelo menos 200 casos de depressão, 160 de transtorno bipolar e quase 500 de dependência química.
Mercado regulado x apostas ilegais
As medidas propostas se concentram no mercado legalizado, que já opera sob exigências de responsabilidade social e transparência. Toda publicidade de bets legalizadas, por exemplo, precisa citar o conceito de jogo responsável.
As casas de apostas licenciadas ainda devem adotar as novas ferramentas de jogo responsável, como o autoteste, a autoexclusão e alertas sobre comportamento de risco.
Enquanto isso, plataformas ilegais continuam a atuar sem os mesmos mecanismos de proteção aos jogadores, agravando o risco de dependência e endividamento. Estimativas do Aposta Legal apontam que o mercado ilegal pode ter levantando cerca de R$ 1 bilhão em receita somente em setembro de 2025.
Com as novas ações, o governo busca equilibrar a expansão do mercado regulado com a proteção da saúde mental dos apostadores, tornando o Brasil um dos primeiros países da América Latina a integrar políticas públicas de saúde mental mais ostensivas ao setor de apostas.