Como o Jogo Responsável pode evitar complicações para atletas profissionais?
Quando pensamos nas apostas esportivas e Jogo Responsável, pensamos sempre sobre prevenção ao vício em apostas de usuários comuns.
No entanto, pouco é dito sobre a relação dos jogadores profissionais e as apostas esportivas, e como o Jogo Responsável pode contribuir para a integridade do esporte.
Com a popularização das apostas online, é cada vez mais fácil que atletas estejam envolvidos em polêmicas relacionadas às apostas, hora jogando, hora manipulando resultados. E, em ambas situações, as consequências são muito graves.
Caso Lucas Paquetá e Operação Penalidade Máxima
Mais recente na mídia, o caso do jogador Lucas Paquetá é um exemplo muito bom para alertarmos sobre a necessidade de trazer os atletas para o debate sobre as apostas esportivas e a integridade do esporte, com o objetivo de conscientizá-los e educá-los.
Independentemente de ser culpado ou não, essa situação ilustra sobre a importância de alertar os atletas de que eles estão envolvidos, direta ou indiretamente, na indústria das apostas esportivas.
Nesse caso em específico, há indícios de que o atleta tenha realizado manipulação cometendo faltas com a intenção de ser penalizado com cartão amarelo.
Tudo isso para que as apostas de pessoas que moram no local em que o atleta nasceu fossem vitoriosas.
Lucas Paquetá, um atleta profissional, com uma carreira sólida, de sucesso e cotado para a Seleção Brasileira, pode ter colocado seu futuro como jogador profissional em risco por conta de uma atitude que, muito provavelmente, não sabia que teria toda essa repercussão e consequências.
Talvez por desconhecimento de como funciona a indústria e a fiscalização em relação a integridade do esporte, pensava que não poderia ser punido.
Esse pensamento esteve muito presente também nos casos da Operação Penalidade Máxima, no qual diversos atletas foram pegos manipulando resultados em competições brasileiras, novamente na questão de cartões. Os exemplos de consequências são diversos, com atletas sendo banidos ou afastados por longo tempo dos gramados, praticamente decretando o fim de suas carreiras.
O Jogo Responsável, aplicado como uma filosofia de envolvimento saudável com a prática das apostas esportivas, surge também como alternativa de conscientização dos atletas sobre a importância de conhecer os riscos da manipulação e do seu envolvimento com os jogos, independentemente se são eles próprios apostando ou pessoas ao seu redor.
É interessante que os clubes atraiam profissionais relacionados à indústria das apostas esportivas e da área da saúde mental para falar e ensinar sobre a integridade do esporte, como funcionam os mecanismos de fiscalização das casas de apostas e a importância de um jogo limpo, ao mesmo tempo que deverá alertar sobre o risco de desenvolvimento da ludopatia por serem considerados população de risco.
Os atletas profissionais estão diretamente ligados à indústria das apostas, já que são suas ações que estão relacionadas aos mercados disponibilizados pelas bets.
Não à toa, toda regulamentação traz a proibição do envolvimento não só de atletas profissionais, mas de todos os cargos relacionados com eventos esportivos.
É importante levar para dentro dos clubes a noção do Jogo Responsável, entendendo que a indústria das apostas e a indústria do esporte se misturam.
Os clubes podem proporcionar palestras e atividades relacionadas à integridade do esporte, para entender como funciona o mercado de apostas esportivas e quais penalizações podem ser aplicadas em caso de manipulação, inclusive explicando o que pode ser considerado manipulação de resultado.
No Brasil, recentemente o Athletico-PR fez uma parceria com a Genius Sports para promover a integridade do esporte para seus atletas e funcionários.
Além disso, é importante a presença de profissionais da saúde da área da saúde mental com experiência em apostas esportivas, com o intuito de prever comportamentos que possam indicar o desenvolvimento de ludopatia, realizar atividades relacionadas ao Jogo Responsável com conscientização, informação a respeito do risco por serem considerados população de risco pela profissão que exercem.
É possível, também, aplicar questionários com validade científica de forma anônima e regular para avaliar a presença de comportamentos nocivos em relação às apostas ou jogos de cassino.
Os clubes não devem direcionar seus esforços apenas para os atletas principais, mas também fazer um trabalho de prevenção principalmente com os jovens atletas, que estão ainda mais expostos ao risco por serem iniciantes na carreira.
Caso Tonali, Fagioli e Toney
A questão da integridade do esporte geralmente é o tema quando se fala no envolvimento de atletas profissionais com apostas esportivas, mas é importante também trazer o elemento do vício.
Alguns estudos científicos realizados identificaram que os atletas profissionais constituem população de risco de desenvolvimento de ludopatia.
Enquanto pessoas de outras profissões, a porcentagem de ludopatia fica entre 0.2% a 5.5% da população, a depender do país, entre atletas profissionais essa porcentagem chega até a 8.8% (M. Grall-Bronnec, 2016).
Alguns motivos que podem justificar essa prevalência dos atletas profissionais com potencial de desenvolver o Transtorno do Jogo podem ser:
- O ambiente profissional contribui para selecionar indivíduos com traços competitivos, que são pessoas com mais índices de problemas com o jogo. (Weiss & Loubier, 2008).
- Compartilhamento de dicas de apostas entre os jogadores nos períodos de treino e concentração;
- A combinação entre altos salários, ascensão financeira muito rápida, tempo sem supervisão e tempo livre podem facilitar o jogo e, assim, facilitar o desenvolvimento de problemas com o Jogo (Revheim & Buvik, 2009)
- A personalidade de perseguir a euforia, a excitação, buscando constantemente o prazer
- Apostar para regular as mesmas emoções conseguidas quando marcaram um gol, tinha uma vitória um conquistaram um título importante
- Tempo livre fora dos treinamentos e jogo
- Causar alívio de frustrações ocasionadas por má performance, ser tirado do time ou ter se lesionado.
Alguns relatos também trazem que os problemas com apostas muitas vezes são mascarados nos clubes, com difícil detecção por conta dos altos salários que dificilmente vão deixar o atleta em situação complicada financeiramente, diferente de problemas com álcool e drogas.
Integridade e conscientização: protegendo os atletas e o esporte
O crescimento do cenário das apostas esportivas devem estar diretamente ligados à conscientização dos atletas sobre o mercado, a importância da integridade do esporte e os riscos.
Além da prevenção ao vício dos atletas que constituem população de risco de desenvolvimento da ludopatia, fornecer informação e educação de qualidade, explicando como o mercado funciona e o crescimento de conscientização dos atletas contribui para diminuir o envolvimento destes com as apostas, direta ou indiretamente.
Os clubes devem entender sua responsabilidade social e se envolverem na discussão, se preparando com profissionais com experiência na área e/ou realizando parcerias com empresas do setor, não focando apenas no patrocínio, mas principalmente na prevenção e conscientização de problemas relacionados às apostas, seja manipulação de resultados ou ludopatia.
“Dessa forma, teremos um ambiente mais ético, sustentável e os jogadores poderão tomar decisões mais conscientes e inteligentes.”
É preciso entender que os atletas são parte envolvida na indústria das apostas, queiram eles ou não, sendo inclusive objeto de apostas por parte dos usuários.
Trazer os atletas para o debate sobre o tema é algo fundamental para um crescimento ético do setor, combater o preconceito da população sobre a manipulação de resultados e mirar em uma indústria sustentável e sem corrupção.
Referências bibliográficas
M. S. M. Lim, H. Bowden-Jones, M. Salinas; J. Price; G. M. Goodwin; J. Geddes & R. D. Rogers (2016): The experience of gambling problems in British professional footballers: a preliminary qualitative study, Addiction Research & Theory.
Revheim T, Buvik K. 2009. Opportunity structure for gambling and problem gambling among employees in the transport industry. Int J Mental Health Addict. 7:217–228.
Weiss SM, Loubier SL. 2008. Gambling behaviors of former athletes: the delayed competitive effect. UNLV Gaming Res Rev J. 12:53–60
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