Entenda sinais de quando as apostas podem ser um vício
Tudo começa com uma aposta bem sucedida. Em seguida, vêm outras, acompanhadas de perdas. De repente, o jogo que era uma diversão passa a ser uma doença.
A ludopatia é reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como doença, tendo inclusive um código no Cadastro Internacional de Doenças (CID).
A propensão a riscos cada vez maiores, a necessidade de jogar com mais frequência e em maiores valores podem apontar para um problema, principalmente se o jogo começar a interferir em outros aspectos da vida do apostador.
Caso o apostador perceba alguns desses sinais, pode ser a hora de tentar se afastar do jogo, utilizando ferramentas de auto exclusão nas casas de apostas e contando com apoio psicológico e/ou psiquiátrico.
O apoio de familiares e amigos também é importante nesse processo e existem grupos que prestam auxílio a quem precisa de ajuda.
Por que os jogos viciam?
A psicóloga cognitivo comportamental com formação em diagnóstico de psicopatologias, Ananda Reis, explica que a raiz de todos os vícios é muito semelhante.
Entre muitas aspas, o vício em jogos ocorre no cérebro de uma forma parecida a outros vícios, como em comida, compras, álcool ou drogas.
Ela ilustra que, no momento em que o apostador ganha uma aposta, o cérebro libera diversos neurotransmissores responsáveis pela sensação de bem estar. A dopamina é a principal responsável pela criação de um vício.
“A pessoa vai tendo cada vez mais necessidade de continuar jogando e apostando para ter aquela sensação que ele teve de início, assumindo riscos maiores.”
Isso porque o sistema de recompensas do nosso cérebro é “plástico”, se adaptando aos estímulos que são recebidos. A depender do grau de vício, o jogo pode passar de uma mera diversão para uma necessidade.
“É como se o cérebro precisasse, não é mais nem a pessoa que gosta, o cérebro que precisa daquilo. Quando a pessoa perde, aumenta a necessidade dela de continuar jogando para poder ganhar, às vezes a motivação também se baseia nisso”, aponta.
Sinais de atenção
O apostador deve se tornar atento a alguns sinais que podem apontar que os jogos podem estar começando a se tornar um vício. Quando os pensamentos em apostas, odds e recompensas se tornam mais constantes e insistentes, é um sinal de preocupação.
Confira alguns pontos de atenção citados pela psicóloga:
- Urgência em apostar a fim de conseguir mais ganhos, mesmo que isso signifique correr mais riscos e aportes maiores.
- Preocupação frequente sobre apostas, necessidade de se informar sobre o assunto várias vezes ao dia de forma a atrapalhar outras atividades.
- Apostas em momentos e locais de trabalho ou estudo. Quando a linha entre outras áreas da vida e as apostas começam a ficar mais borradas, é um sinal de atenção.
- Necessidade de mentir para amigos, familiares ou companheiros em relação ao papel das apostas na sua vida.
- Perda de interesse em outras atividades cotidianas que costumavam trazer prazer, como sair com os amigos, ir à praia ou praticar esportes.
Como conseguir ajuda?
É possível sair do vício em jogos. Reconhecer que se precisa de ajuda é o passo mais difícil, mas fundamental para se evitar perdas maiores, tanto financeiras quanto sociais.
O Jogadores Anônimos existe desde 1957 e acolhe pessoas que querem parar de jogar. A entidade realiza reuniões online todos os dias e organiza encontros presenciais em oito capitais brasileiras.
Um membro do JA que preferiu não se identificar contou ao Aposta Legal Brasil que têm sido mais comum ao longo do tempo as pessoas pedirem ajuda mais cedo, com perdas menores.
Ele ressalta, contudo, que os sinais de alerta são muito individuais. Uma perda de R$ 200, por exemplo, pode não significar tanto para um, mas ser um sinal de vício para alguém que só tinha aquele dinheiro para pagar contas domésticas.
“É uma roleta, hoje você perde R$ 5 mil, amanhã R$ 15 mil. Você sempre vai dormir com o pensamento de ‘amanhã eu recupero tudo’. Isso é a doença falando, que a gente fala.”
Ele considera que a procura pelo grupo têm crescido e que deve aumentar ao longo deste ano, que “sempre aumenta”.
É possível conseguir apoio dos Jogadores Anônimos na linha de apoio da entidade, por meio do Whatsapp (11) 3229 1023, ou no site, que traz informações sobre as próximas reuniões. Não é necessário qualquer tipo de cadastro.
Vício em jogos e a regulamentação
Para o presidente do Instituto Brasileiro de Jogo Responsável (IBJR), André Gelfi, a regulamentação das apostas esportivas é um passo importante para o setor, inclusive ajudando com medidas contra o vício em jogos.
“Eu custo a acreditar que um mercado desorganizado venha a ter menos ludopatia que um mercado organizado, vamos ter ferramentas novas para o combate à ludopatia”, aponta.
Ele destaca que o Ministério da Fazenda deverá publicar portaria com uma série de exigências relacionadas a jogo responsável para as empresas que pretendem atuar no Brasil.
E ressalta que a própria lei destina parte da arrecadação ao tratamento do transtorno do jogo compulsivo.
“A gente está falando de uma previsão de arrecadação da ordem de bilhões, esse dinheiro pode ser destinado da melhor forma para proteger a sociedade, inclusive contra a ludopatia. Acreditamos que recursos não vão faltar”, diz.
Segundo Gelfi, o IBJR está trabalhando para elaborar projetos ligados ao jogo responsável, que devem ser colocados em prática nos próximos meses.