Nubank vs. bets: por que banco tenta frear pix para apostas?
Em uma iniciativa que chamou atenção do mercado financeiro nesta semana, o Nubank passou a exibir mensagens em seu aplicativo sugerindo que clientes reconsiderem transferências destinadas a casas de apostas.
Ao identificar uma transferência para uma chave pix associada as bets, o banco exibe alertas para o apostador como: “Que tal guardar esse dinheiro?”.
A medida, que faz parte de um teste restrito com uma pequena parcela de usuários, também inclui questionamentos diretos no processo de transferência. Caso o cliente confirme que o dinheiro será usado para apostas, o aplicativo oferece uma última oportunidade para reconsiderar antes de concluir a transação.
Segundo o Nubank, a iniciativa visa conscientizar sobre os riscos financeiros associados às apostas, mas sem bloquear transferências.
As associações que representam o setor de apostas, como a AiGaming, Abrajogo e ANJL, rapidamente reagiram à novidade. Em nota conjunta, as associações classificaram a medida como discriminatória e contrária aos princípios de liberdade econômica.
“O setor de apostas é legalizado pelas Leis nº 14.790/2023 e 13.756/2018 e regulamentado por portarias ministeriais. Ao adotar essa prática, o Nubank se posiciona contra uma atividade totalmente legal no Brasil”
Liberdade econômica versus restrições financeiras
O setor de apostas destacou que a medida é vista como uma tentativa do banco de extrapolar seu papel regulatório.
As associações também criticaram a falta de critérios claros na identificação de chaves pix vinculadas a operadores legais, enquanto centenas de sites ilegais continuam a operar no Brasil sem qualquer tipo de restrição.
Plínio Lemos Jorge, presidente da ANJL, argumentou que a postura do Nubank prejudica a regulamentação do setor. “Não faz sentido algum que os alertas não sejam ativados para operadores ilegais, piorando ainda mais o cenário em vez de ajudar a fortalecer a regulação no país”, afirmou.
As associações também lembraram que o setor contribui de forma significativa para a economia, com a geração de empregos e o pagamento de tributos. “Restrições seletivas só prejudicam o equilíbrio do mercado”, conclui a nota.
Comportamento do apostador brasileiro
Uma pesquisa realizada pelo Aposta Legal sobre os hábitos de apostas no Brasil trouxe à tona dados interessantes sobre o perfil dos apostadores. De acordo com o levantamento, seis em cada dez apostadores fazem apostas semanalmente, enquanto oito em cada dez apostam pelo menos uma vez por mês.
O estudo também mostrou que a maioria dos apostadores tem um ticket mensal abaixo de R$ 50. Aproximadamente 45% declararam gastar menos de R$ 50 por mês em apostas, enquanto apenas 2% afirmaram investir mais de R$ 500 nesse tipo de atividade.
Quando questionados sobre responsabilidade, 72% dos apostadores disseram se considerar muito responsáveis ao apostar. Por outro lado, 10% declararam se sentir nada responsáveis, enquanto 18% acreditam ser moderadamente responsáveis.
O estudo foi realizado por meio de questionário online entre os dias 5 e 25 de abril de 2024, com 2.010 participantes e margem de erro de 2,2 pontos percentuais.
Análise: momento crítico na relação entre bancos e apostas
Curiosamente, a iniciativa do Nubank ocorre em um momento sensível para o mercado. Após a regulamentação das apostas e a proibição de utilização de cartões de crédito em bets, bancos começaram a adotar medidas mais agressivas contra a atividade.
Especialistas observam que essas ações poderiam ter ocorrido antes, mas ganharam força após a regulamentação — com bancos até restringindo o limite de crédito para apostadores frequentes.
Uma questão central nessa dinâmica é o impacto das apostas na inadimplência, especialmente com o uso de crédito.
Estudos da Febraban indicam que as apostas online estão associadas ao aumento da inadimplência, com projeções de até 27,1% no índice geral de pessoas físicas. A proibição de crédito nas apostas, portanto, reduz os ganhos dos bancos em juros e rotativos — uma das principais fontes de lucro dessas instituições.
A situação lembra o receio vivido pelo varejo, especialmente supermercados, no ano passado, com clientes priorizando apostas a compras essenciais.
Esse contexto evidencia como a relação entre o sistema financeiro e o mercado de apostas continua a se transformar, com consequências tanto para os consumidores quanto para as empresas envolvidas.